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20/12/09 03:00 - Economia

Medo de perder receita emperra reforma tribut�ria

Para Paulo de Barros de Carvalho, professor-doutor em�rito da USP e coordenador de p�s-gradua��o na PUC, a justi�a fiscal est� distante

Aur�lio Alonso
A falta de entendimento entre 27 Estados dificulta aprovar uma reforma tribut�ria radical que poderia minimizar as desigualdades na cobran�a de impostos. Paulo de Barros de Carvalho, professor-doutor em�rito da Universidade de S�o Paulo (USP) e coordenador de p�s-gradua��o na Pontif�cia Universidade Cat�lica (PUC), gosta de citar a m�xima do falecido professor Osires de Azevedo Lopes Silva para ilustrar a quest�o da queda-de-bra�o entre governo e contribuinte: �De cada um real arrecadado um � sonegado�.

Tributarista ligado ao Instituto Brasileiro de Estudos Tribut�rios (Ibet), uma institui��o com 35 anos de exist�ncia formada por seleto grupo de professores que conhece bem a quest�o tribut�ria, ele admite, por�m, que n�o sabe quem est� com a raz�o no embate governo-contribuinte.

Did�tico, Carvalho n�o � polemista, mas � realista quando diz que o governo n�o faz a reforma tribut�ria por receio de perder receita e pela complexidade da legisla��o brasileria.

Em entrevista ao JC em sua fazenda em Prat�nia, pr�xima a Botucatu, explicou tamb�m sobre o excesso de poder da Uni�o e das medidas adotadas pelo Estado de S�o Paulo para enfrentar a guerra fiscal, a chamada substitui��o tribut�ria. A seguir, os principais trechos da entrevista.


Jornal da Cidade � Professor, o Brasil, apesar de ser ainda um Pa�s em desenvolvimento, tem uma taxa��o de imposto comparada a de pa�ses superdesenvolvidos. Por que se cobra tanto imposto?

Paulo de Barros Carvalho
� O Brasil cobra muito imposto, mas h� tamb�m uma economia informal muito grande. O contribuinte entende que n�o deve pagar muito imposto, porque o governo n�o d� retorno adequado em investimentos. Em outros pa�ses a taxa��o � igual ou maior do que a do Brasil, por�m h� retorno dessa arrecada��o. De modo que, como n�o existe essa reciprocidade, ent�o, os contribuintes n�o est�o preocupados em recolher tudo o que teriam direito. O governo alega que n�o presta servi�o porque n�o arrecada o que deveria arrecadar. Osires de Azevedo Lopes Silva, morto recentemente, dizia que a cada real arrecadado um � sonegado. N�o saberia dizer quem tem raz�o, mas mesmo com tanta arrecada��o o Pa�s vive momento auspicioso na economia em fun��o do contexto internacional e do que foi plantado nos governos anteriores e neste atual.


JC � O que precisa ser feito para melhorar?

Barros
� A id�ia para dar equacionalmente seria uma reforma radical como foi proposto pelo governo.


JC � A �ltima proposta � de um imposto sobre valor agregado que seria arrecadado nacionalmente?

Barros
� Exatamente, pensou-se em arrecadar o imposto de valor agregado pela Uni�o, a qual repassaria parte aos Estados. Isso tudo est� parado.


JC � Por que n�o sai a reforma tribut�ria?

Barros
� O Brasil tem uma estrutura jur�dica muito complexa. S�o 27 Estados junto com o Distrito Federal. Tudo isso forma outro ente, que � a Uni�o com personalidade pol�tica e jur�dica pr�pria, diferente dos Estados. H� cerca de 5.600 munic�pios, todos aut�nomos e com compet�ncias. Todos eles teriam de sentar-se � mesa para discutir a reforma. Por que n�o sai a reforma tribut�ria? Exatamente por isso: n�o h� acordo entre esses entes pol�ticos. H� desigualdades regionais, Estados consumidores e industrializados. Nenhum deles, com exce��o do contribuinte, quer a redu��o dos impostos. Desde que saiu a Constitui��o de 1988 se fala em revis�o (houve muito leve) e depois veio o governo Fernando Henrique Cardoso, mas se dissolveu no segundo mandato dele, depois renovou a proposta e nem foi adiante. Lula veio entusiasmado, por�m n�o foi adiante. Neste segundo mandato tamb�m n�o foi adiante. Est� parada. H� 1.000 emendas substitutivas. Para se ter id�ia, apenas uma j� traz problema terr�vel de reorganiza��o na legisla��o tribut�ria, imagina 1.000.


JC � A Lei de Responsabilidade Fiscal foi um avan�o para coibir os gastos p�blicos, mas o Estado tem facilidade de arrecadar, por�m dificuldade de devolver o que arracada em investimentos. Por qu�?

Barros
� O Poder P�blico exerce seu papel em querer arrecadar mais, n�o que administre mal, mas eleva muito os custos. Essa despesa cada vez maior faz com que se desorganize o sistema. Insisto numa tese: o sistema tribut�rio brasileiro � bom e avan�ado em rela��o a outros pa�ses. � de causar inveja em termos de velocidade nas movimenta��es e presteza nas iniciativas. Um professor do Equador me perguntou como no Brasil � mais r�pida a tramita��o de aumento de al�quotas de impostos. L�, para aumentar uma al�quota, o sistema n�o favorece e n�o consegue aumentar no percentual que todos querem. O sistema brasileiro � diferente e mais �gil. N�o quer dizer que opera pelo bem. H� s�rie de valores que poderiam ser implantados, mas n�o foram. A justi�a fiscal est� distante.


JC � Por que a legisla��o tribut�ria � complexa?

Barros
� Vivemos numa sociedade p�s-moderna. O que a caracteriza � a hipercomplexidade das rela��es sociais. A vida social est� mais complexa. Os bancos s�o objetivos e n�o fazem opera��es sem precisar. Descobri que uma opera��o que era feita h� 10 anos com nove procedimentos nos bancos agora necessita 23 procedimentos. O que � isso, os bancos est�o praticando a��es desnecess�rias? N�o, os bancos exploram com racionalidade muito grande. � um dado da sociedade p�s-moderna. O que fazer? Tentar exercitar todas as fun��es da maneira mais racional. Isso transportado para o campo tribut�rio significaria que os governos federal, estadual e municipal deveriam fazer esfor�os de racionalizar suas legisla��es. H� muitas leis desnecess�rias e muitas precisam de consolida��o mais racional. Isso n�o tem sido feito. Esse esfor�o implica num primeiro momento em perda de arrecada��o. A m�dio prazo uma recupera��o e, a longo prazo, progresso na arrecada��o. Eles n�o querem admitir a responsabilidade pela queda de arrecada��o. Acho que esta seria a medida mais p� no ch�o.


JC � H� reclama��o da concentra��o de poder da Uni�o?

Barros
� Nos �ltimos anos houve fortalecimento da Uni�o em detrimento do Estado e munic�pios. Tudo no nosso sistema corre para favorecer o Executivo federal forte. Os Estados n�o se fortaleceram, j� os munic�pios, fora as capitais, tamb�m n�o. A Uni�o tem o poder jur�dico maior. S� de impostos s�o sete, os Estados s�o tr�s e munic�pios tr�s. Fora as contribui��es que a Uni�o pode arrecadar. Tudo gira em torno de Bras�lia e antigamente a federa��o era mais equilibrada em detrimento a Estados e munic�pios. Em fun��o disso, os munic�pios ficam com chap�u na m�o perante a Uni�o.


JC � Em S�o Paulo, o governo adotou a substitui��o tribut�ria. Ela � constitucional?

Barros
� N�o � algo que atente contra princ�pios constitucionais, segundo eu entendo, mas estamos em ambiente de franca guerra fiscal de Estado contra Estado e munic�pios contra munic�pios disputando o universo cada vez maior de contribuintes. A competividade � at� boa, por�m surgem os excessos do tipo de Estados que passam a retaliar outros. O Conselho Nacional de Pol�tica Fazend�ria (Confaz) tem instrumentos para administrar a guerra fiscal, mas tem dificuldade porque dele fazem parte representantes de Estados com muita influ�ncia. � uma disputa acirrada. Eu diria que a guerra fiscal � problema inevit�vel.


JC � O Estado de S�o Paulo tem adotado medidas corretas para conter a guerra fiscal?

Barros
� O Estado de S�o Paulo tem adotado uma posi��o de empenho. N�o h� d�vida que tem respondido �s agress�es de outros Estados. S�o Paulo tem feito esfor�o de simplifica��o. A nota fiscal simples � uma medida, n�o que vai resolver, mas o governo est� empenhado e se defendendo contra os outros Estados. O Confaz deveria ter uma a��o mais objetiva contra a guerra fiscal. A substitui��o tribut�ria responde a um problema de economia administrativa: ao inv�s de fiscalizar um universo imenso de contribuintes, fiscalizar meia d�zia. At� quando essa comodidade fiscal pode ir, n�s sabemos que se avan�ar gera injusti�a em termos tribut�rios. Esse � o problema que coloca: h� o ditado que tudo em excesso � veneno. A substitui��o tribut�ria se n�o administrada ou levada em excesso ou se abusarmos, passa ser uma coisa mal�fica.




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