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Trabalho passa de tempor�rio a permanente

Dificuldades de entrar no mercado somada � necessidade de se manter financeiramente atraem mulheres para o emprego dom�stico

Wanessa Ferrari
No in�cio, trabalhar como dom�stica � apenas uma forma de conseguir dinheiro para se manter por um per�odo curto de tempo. Depois, o trabalho come�a a consumir uma grande parcela de tempo, os estudos s�o abandonados e com eles se v�o as chances de mudar de profiss�o. � assim que muitas dom�sticas ingressam na carreira: como trabalhadoras tempor�rias. E, por ou falta de oportunidade, comodismo ou costume acabam ficando.

Ningu�m sonha em ser empregada dom�stica, � a necessidade que for�a 15,8% das mulheres brasileiras a assumirem o cargo. Gina de Oliveira Ferreira, 38 anos, por exemplo, trabalha como empregada dom�stica h� 12 anos. Antes ela era chefe de se��o de uma f�brica de jeans que faliu. Com a necessidade batendo � porta de sua casa, ela se viu for�ada trabalhar como dom�stica.

�Procuro fazer meu servi�o da melhor maneira poss�vel, mas n�o gosto do que fa�o. Durante algum tempo at� tentei outro servi�o, mas � complicado, acabei acostumando com a fam�lia que trabalho e me acomodei�, conta.

A necessidade financeira tamb�m foi respons�vel pela perman�ncia de Ana Maria dos Reis Bueno, 50 anos, no cargo de empregada dom�stica. Ela teve de trabalhar pela primeira vez quando tinha apenas 13 anos, ap�s o falecimento de seu pai. �Para ajudar minha m�e comecei a limpar casa em troco de algum dinheiro. Parei de estudar no 2� ano do ensino fundamental. Como tenho pouco estudo, n�o consigo arrumar outro servi�o�, conta.

Bueno tem um diferencial: ela mora na casa da patroa e � empregada em tempo integral. �N�o � bom morar no trabalho. Perde-se um pouco de tudo, da liberdade, da privacidade. Por mais que eu me sinta parte da fam�lia, nada � como a casa da gente�, se queixa.

A patroa de Bueno, Em�lia Maria Machado Alvisi, 59 anos, conta que optou por uma empregada que more no emprego justamente por necessidade. �Eu tenho dois netos sob a minha tutela e preciso trabalhar para sustent�-los e a casa. O problema � que trabalho durante a noite, e a Ana estando em casa eu fico tranq�ila�, explica.

Alvisi j� chegou a se questionar se compensa trabalhar e ter de pagar o sal�rio da empregada e todos os encargos de sua moradia. �Grande parte do que ganho vai para o sal�rio e os encargos dela, mas preciso trabalhar porque com o que sobra consigo viver�, acrescenta.

Bueno conta que o amor que tem pelas crian�as de Alvisi � o que faz se submeter ao trabalho em per�odo integral. �Mesmo n�o ganhando o suficiente, n�o penso em trabalhar em outro lugar. As crian�as s�o tudo para mim�, conta.


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Diaristas


Tamb�m foi pela escassez de alternativas que L�a Rodrigues se tornou diarista. �Fui manicure por muito tempo, mas tive de mudar de profiss�o porque tive um problema no olho. Como sei que dificilmente conseguiria alguma coisa melhor, fui trabalhar como dom�stica. A minha sorte � que eu amo o que fa�o�, explica.

L�a faz parte das 1,645 milh�o de mulheres que s�o diaristas no Brasil. Ela � uma das respons�veis pela mudan�a no mercado de trabalho: as diaristas est�o ocupando um espa�o em que as empregadas chamadas mensalistas reinavam absolutas.

A justificativa est� na renda destas trabalhadoras: elas ganham cerca de 17% a mais que a empregada mensalista, uma diferen�a que representa cerca de R$ 57,00 no sal�rio final.

�Al�m de ganhar mais como diarista, ainda me sinto livre para programar as minhas folgas. Eu n�o tenho uma obriga��o, um compromisso para cumprir�, explica L�a.

O dinheiro a mais no final do m�s pode fazer a diferen�a no futuro. Isso porque somente 14% das diaristas t�m carteira assinada, uma vez que n�o � obrigat�rio registrar a empregada que n�o presta servi�o de forma cont�nua.

�Nunca me preocupei com o fato de n�o ter carteira assinada, mas agora come�o a temer por isso. Preciso come�ar a contribuir como aut�noma, mas ainda n�o fui atr�s disso�, conta.

Mesmo contrapondo os benef�cios da remunera��o na fun��o de diarista com as desvantagens em termos de formaliza��o, L�a n�o muda de id�ia. �Ser diarista � melhor. Na minha folga programada eu limpo a minha casa. Amo casa limpa e cheirosa.�


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Fatores hist�ricos t�m grande
peso no perfil dom�stico



A figura da empregada dom�stica surgiu no Brasil Col�nia e tem caracter�sticas da rela��o casa-grande versus senzala. A afirma��o � da doutora em hist�ria e especializada em estudo de g�nero feminista Lilian Henrique Azevedo, para quem os elementos respons�veis pela forma com que o trabalho dom�stico � visto atualmente est�o nas ra�zes da forma��o do Brasil.

�Era comum os senhores do engenho abrigarem negras escravas na casa grande para fazerem os servi�os dom�sticos e tamb�m companhia para as senhoras� , conta. As rela��es de afeto tamb�m s�o provenientes deste per�odo. �Negras que serviam como ama-seca ou ama-de-leite eram comumente como membros da fam�lia sem deixarem de ser subalternas. Um segundo aspecto � o constante envolvimento dos patr�es com as escravas. A miscigena��o criou la�os afetivos entre patr�o e empregada�, aponta.

Azevedo atribui parte da desvaloriza��o do trabalho dom�stico ao fato de que �ser da fam�lia� n�o confere direitos. �O trabalho desenvolvido se torna invis�vel�, define a historiadora.

Mas a fun��o de empregada dom�stica que se conhece no Brasil n�o existe em pa�ses do Norte. L�, as nativas que exercem esta fun��o se profissionalizaram: elas s�o aut�nomas, levam todo o material e servi�o para a casa onde trabalham, fazem o que tem de ser feito e s�o bem pagas e valorizadas por isso.

Para Azevedo, esse exerc�cio ainda n�o � popular no Brasil devido aos aspectos tecnol�gicos. �Os Estados Unidos, por exemplo, recebeu uma coloniza��o pr�xima da que recebemos, mas a Revolu��o Industrial surtiu efeito l� primeiro. Al�m disso, a necessidade de m�o-de-obra barata fez as mulheres sa�rem de casa e trabalharem. O surgimento da comida congelada foi um grande impulsor para a profissionaliza��o feminina�, compara.


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�Meu diploma n�o vai
pagar minhas contas�



Formada como auxiliar de enfermagem, Dirce do Carmo Cardoso, 45 anos, trabalha como empregada dom�stica. Ela conta que se iniciou na presta��o de servi�os dom�sticos com a inten��o de ajudar a fam�lia, quando ainda era crian�a.

�Minha m�e conseguiu um servi�o pra mim na casa de uma senhora. Ent�o, eu sa�a �s 12h da escola e ia direto para l�, onde ficava at� o final da tarde�, lembra ela, que chegou a trabalhar 11 anos na casa da mesma fam�lia.

Mesmo trabalhando enquanto era crian�a, Cardoso n�o abandonou os estudos. Chegou a fazer curso t�cnico de auxiliar de enfermagem e trabalhou na �rea. �Me formei em 2000 e trabalhei em uma escola de crian�as especiais, na cidade de Jaci. Tive de parar porque meu marido se mudou para Bauru e eu precisei sair de Piraju�, cidade onde morava, para acompanh�-lo�, conta.

Com o diploma na m�o, Cardoso mandou curr�culos para diversos hospitais da cidade, mas como nenhum entrou em contato no prazo esperado, voltou a exercer a antiga fun��o. �Percebi que meu diploma n�o ia pagar as minhas contas, ent�o pensei �vou � luta��, explica ela, que h� dois anos trabalha como mensalista em um apartamento.

Recentemente, Cardoso recebeu uma proposta para trabalhar na �rea de sua forma��o em um hospital da cidade, mas n�o aceitou. �Agora que trabalho aqui n�o troco por nada. Meu servi�o � supertranq�ilo, eu amo o que fa�o. Sem contar o filho da minha patroa, o Gabriel, ele tem 2 anos e � minha paix�o. Quando ele se casar vou trabalhar para ele�, planeja.




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