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26/12/06 00:00 - Tribuna do Leitor

Voando para o futuro

E l� est�vamos n�s, retornando do Mato Grosso rumo a S�o Paulo, a bordo da reluzente aeronave de meu amigo e vizinho de fazenda, Luis In�cio. Nossa viagem exigia uma escala para reabastecimento e desta feita Luis optou por Bauru. Estava saudoso da terra da areia branca, da ferrovia, da inesquec�vel Eni e tamb�m de nosso grande companheiro Pedro Henrique, veterin�rio de m�os cheias, que naquelas bandas desenvolvia em sua fazenda o que h� de mais moderno em termos de sele��o gen�tica de gado de corte. Luis planejou nossa escala para o rec�m-inaugurado aeroporto Bauru/Arealva.

Iniciamos o procedimento de descida e Luis In�cio, animado como sempre, me alertou: �prepare-se para conhecer a modernidade. Vamos pousar em breve no mais novo aeroporto do Estado de S�o Paulo�. Continuamos nossa descida e logo adiante um comunicado do Controle Bauru: �chame agora a Freq��ncia Livre e bom pouso�. Freq��ncia Livre ? admirou-se Luis In�cio. Essa � a que eu uso quando pouso em Avar�, que � a mesma de Ibitinga, de Len��is Paulista, da fazenda do Julinho, do Amaral , do Pedro Henrique ... Enfim, � um �canal� que sintonizamos onde inexiste controle algum que possa nos dar qualquer apoio, onde os pilotos em v�o de tudo quanto � canto transmitem desordenadamente suas posi��es e inten��es, na esperan�a de que algum outro que possa estar vindo em sentido contr�rio saia da frente e n�o nos cause surpresas inesperadas.

Mas isto n�o seria motivo para tirar o bom humor do Luis. Afinal, sua aeronave estava equipada com o que havia de mais avan�ado em instrumentos de navega��o e pouso. Algo por�m n�o corria bem e aquele painel ultramoderno insistia em n�o funcionar. VOR�s, DME, ADF�s nada. Notei certa decep��o em Luis In�cio ao constatar que nada iria funcionar pois o tal do aeroporto novo n�o contava ainda com estas conveni�ncias. Afinal, isso n�o era nada que a boa e velha b�ssola, um cron�metro e um mapa n�o pudessem resolver e em poucos minutos pousamos na maravilhosa pista, taxiando para estacionar defronte ao imponente Terminal de Passageiros onde um funcion�rio do aeroporto com seus gestos semi-incompreens�veis, nos indicava o local em que dever�amos estacionar.

Ao desembarcar senti a agrad�vel sensa��o de pisar novamente o solo do meu querido Estado, contemplar todo aquele verde a minha volta, para onde quer que eu olhasse e descansar meus ouvidos com o profundo silencio do local ap�s tantas horas sob o ronco constante dos motores daquele avi�o. Parecia ter desembarcado no para�so, um para�so particular, feito s� para n�s. O Luis In�cio tinha raz�o: aquilo sim era um aeroporto moderno, um novo conceito, o aeroporto do futuro!

J� passava do meio dia e resolvemos adentrar o terminal para um almo�o r�pido. Tudo muito bonito, muito limpinho, mas... onde � o restaurante? - perguntei a uma funcion�ria que passeava pelo sagu�o ostentando um crach� pendurado no pesco�o.

Restaurante n�o tem n�o senhor, respondeu-me.

E a lanchonete?

Tamb�m n�o tem, n�o senhor.

Sei......E onde posso tomar um caf� e comer um p�o de queijo?

S� na cidade, respondeu-me com um sorriso meio constrangido.

E onde � que tem um telefone p�blico? Meu celular est� descarregado.

Telefone p�blico s� na vila, aqui n�o tem n�o senhor.

E tem �nibus pra l�?

N�o tem, n�o senhor?

E como eu fa�o? Tenho que pegar um �nibus para a cidade?

Tamb�m n�o tem, n�o senhor??

S� falta voc� me falar que a Casa da Eni tamb�m n�o existe mais!

N�o mesmo, a Eni j� faleceu

Verdade? E n�o deixou sucessores?

Como?

N�o deixou filhos?

Isso eu j� n�o sei lhe informar direito, mas dizem que deixou muitos filhos por aqui. Estava quase ficando indignado quando chega o Luis com cara de poucos amigos. Voc� n�o vai acreditar: n�o conseguiremos abastecer o avi�o, aqui n�o vende gasolina! Claro que acredito, Luis. Descobri que aqui tamb�m n�o vende comida, lanches, refrigerantes, caf�, revistas... nem mesmo um simples cart�o telef�nico! Tamb�m pra qu�? N�o tem telefone! At� a casa da Eni fechou. Ela morreu, mas dizem que deixou um punhado de filhos. Ah, isso eu tenho certeza, exclamou Luis!! Mas tem seu lado bom. De uma s� vez nos livramos do colesterol dos sandu�ches, dos a��cares indesej�veis dos refrigerantes, da cafe�na, dos esc�ndalos das manchetes dos jornais, dos poluentes combust�veis f�sseis e at� mesmo do, apesar de �til, incomodo telefone. N�o lhe falei que ir�amos conhecer o futuro! N�o nos restando outra op��o decidimos tomar nosso caminho e rumamos em dire��o a aeronave onde o Chico, aquele funcion�rio do aeroporto, estava nos aguardando com sua prancheta na m�o para a cobran�a das taxas pela utiliza��o do moderno aeroporto. Ao embarcar ou�o o Luis reclamando: O que � isso no p�ra-brisa?? Coc� de passarinho?? Deste tamanho?? S�o os tucanos, explicou-nos o Chico. Mas tem tucanos morando por aqui? Morando n�o tem, n�o senhor. Aqui eles s� passam voando e de vez em quando deixam estas suas lembran�as.

Acionados os motores decolamos rumo a Piracicaba, onde certamente encontrar�amos combust�vel, com o r�dio sintonizado na tal Freq��ncia Livre. Foi quando ouvimos a voz de nosso amigo Pedro Henrique, o fazendeiro do futuro, anunciando o pouso em sua fazenda, na mesma freq��ncia do aeroporto do futuro. Pensei at� em cumpriment�-lo mas, para falar a verdade, estava meio injuriado com estas coisas do futuro. Muita modernice para um dia s�! No caminho, uma deliciosa chuva de ver�o para lavar o avi�o. Ainda bem, comentou Luis In�cio. S� me faltava ainda ter que limpar esta cagada de tucano.


F�bio Lara




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