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"Idade penal" destaca aluna de Agudos

"Idade penal" destaca aluna de Agudos

Adilson Camargo
Em meio a outros 400 textos, vindos de todo Estado, o de Susana, de Agudos, foi classificado como um dos 15 melhores.

Agudos - Susana Alves Dias, 16 anos, é hoje a aluna que mais tem chamado a atenção de professores, diretora e dos demais colegas da Escola Estadual João Batista Ribeiro, em Agudos. Tudo por causa de um concurso de redação organizado pelo Conselho Regional de Psicologia, de São Paulo. O texto escrito por Susana agradou em cheio aos membros da Comissão da Criança, Adolescente e Família, vinculado ao CRP-SP, e foi classificado como um dos melhores em nível estadual.

A redação de Susana, de 46 linhas, questiona a eficácia da redução da idade penal de 18 para 16 anos, proposta por alguns parlamentares e combatida ferozmente pelo CRP-SP. Aliás, todos os textos que participaram do concurso tinham que, obrigatoriamente, condenar a redução da idade penal. Os organizadores uniram o útil ao agradável. Enquanto estimula os jovens alunos a produzir textos sobre temas sociais, promove uma discussão dentro da sociedade sobre os supostos equívocos inerentes ao projeto de redução da idade penal.

Em seu texto Susana lembra dos problemas sociais vividos hoje por muitos jovens e adolescentes brasileiros. “Sem estudos, sem saúde e, muitas vezes, sem casa” essas pessoas estariam com sua dignidade arranhada e, portanto, propensos ao crime. A questão do menor infrator, em sua opinião, é bem mais abrangente. “Não adianta combater o efeito e não refletir a causa dele.” É uma crítica social, dentro da qual Susana se esforça para apresentar algumas possíveis soluções. “A situação atual (do menor infrator) não seria diferente se não houvesse a miséria, a injustiça e o preconceito?”, questiona.

Susana está cursando a 3ª série do ensino médio e se diz interessada em escrever sobre assuntos que envolvam questões sociais. Ela acredita que desta forma pode ajudar a mudar a realidade do País.

O texto de Susana ficou entre os 15 melhores, dentro de um universo de cerca de 400 trabalhos, recolhidos em todo o Estado. Para participar era preciso ter entre 14 e 17 anos. Além de textos, o concurso abriu também espaço para outras duas categorias: música e fotografia. Os três primeiros classificados em cada uma dessas categorias receberam prêmios que variaram de R$ 500 a R$ 1 mil. Os demais trabalhos selecionados, até o 15º lugar (que foi o caso da redação de Susana), receberam um Certificado de Menção Honrosa. A escola João Batista Ribeiro participou do concurso com 10 trabalhos. Foram nove textos, entre eles o de Susana, e uma música.


“Não foi surpresa”


Os elogios a Susana, no entanto, não ficam restritos à menção honrosa que seu trabalho recebeu no concurso do CRP-SP. A professora de Português e Literatura Maria Cristina Rodrigues da Silva, a Kuca, 47 anos, coloca Susana, que sonha em ser arquiteta, no seleto grupo das melhores alunas da escola.

“Ela é uma das melhores. É decidida, interessada, disciplinada, assídua, sempre teve facilidade em trabalhar com texto. Sua premiação não foi surpresa para nós”, comentou.

O fato de ser professora apenas de alunos da 3ª série do ensino médio, não impediu Kuca de conhecer Susana antes desta ser sua aluna. Ela conta que notou em Susana uma certa habilidade com a produção de textos durante um projeto de Literatura, desenvolvido ano passado.

Como o projeto era aberto à participação de todos os alunos da escola, Susana, que estava na 2ª série, inscreveu seu texto, que acabou sendo um dos destaques. E foi num desses projetos que Susana diz ter despertado seu interesse pela leitura e produção de texto.


Homenagens


Após a divulgação dos resultados do Concurso Contra a Redução da Idade Penal e a Favor da Cidadania, Susana já recebeu duas homenagens. A primeira foi oferecida pelo Conselho Regional de Psicologia, com sede em Bauru, por ocasião da comemoração da Semana do Psicólogo. A segunda homenagem veio da Câmara dos Vereadores, também em Bauru. Por unanimidade, os vereadores aprovaram uma moção de aplausos à Susana, durante a sessão plenária da última segunda-feira.


Arquiteta


Apesar dos seguidos elogios, Susana diz que não teme uma cobrança cada vez maior sobre sua produtividade escolar. Seu próximo desafio começa nesse fim de semana, quando estará prestando vestibular na Unip. No fim do ano será a vez de prestar o exame na Unesp, ambos em Bauru. Apesar da habilidade com textos, ela quer ser arquiteta.


Redação premiada

“Não ao caminho mais curto”

O adolescente infrator está se tornando um problema para a sociedade. Sem estudos, sem saúde e muitas vezes, sem casa, portanto sem dignidade e cidadania.

No nosso país é comum que essa questão vá para na polícia. Mas do que adianta levar tudo às últimas conseqüências sem ao menos parar e pensar no porquê desta situação. Não existe efeito sem causa, todo ato infracional leve ou grave terá efeito idêntico a sua causa. Se queremos combater a violência, tomemos então medidas para que não hajamos motivos para ela ser praticada. Mas não há reflexão! Estamos sempre procurando o caminho mais curto: a punição. Com ela a discriminação e as generalizações que já existem e só tendem a aumentar.

O que será do nosso país daqui a um ano? Centenas de adolescentes encarcerados, junto a criminosos que praticaram atos muitos mais graves ou até mesmo inocentes e até, às vezes, acusados sem provas?

Não precisamos de medidas que apenas finjam resolver o problema. É uma questão que envolve toda a sociedade e a família do adolescente. Julgar, condenar, exercer o autoritarismo, não promoverá a solução.

Se talvez não existissem as diferenças sociais, o preconceito, poderia até ser diferente, pois não há em nenhum lugar do mundo, um adolescente que pense sinceramente em ser um marginal no futuro. Todos têm sonhos... Por que uma pessoa comete atos criminosos? Qual a sua “cabeça”? Qual seu estado emocional? Qual o seu grau de maturidade e idade? O que ela busca? Qual o seu projeto de vida? Ela tem perspectivas? Como estão os seus vínculos sociais e familiares? Qual sua situação econômica?

Cada pessoa é única e tem o seu universo, seu histórico de saúde física e psíquica, um tipo de educação. Não podemos, pela nossa situação, prender ou discriminar um jovem infrator, mas sim procurar condições para que essa situação não aconteça. Não adianta combater o efeito e não refletir a causa dele. A miséria é uma das causas que levam o jovem a se comprometer negativamente. A situação atual, não seria diferente, se não houvesse a miséria, a injustiça e o preconceito? Se estamos a favor de mudanças, temos de começar pelos porquês, ou seja, o que está causando isso?

Por que o artigo 6º da Constituição Federal não é aplicado a todos? Por que a maioria dos infratores não tem ao menos uma educação? “Se a Educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda. Se a nossa opção é progressista, se estamos a favor da vida e não da morte, da eqüidade e não da injustiça, do direito e não do arbítrio, não temos outro caminho senão viver plenamente a nossa opção. Encará-la, diminuindo a distância entre o que dizemos e o que fazemos”. Se um jovem for preso e não puder ter educação, sendo ela interrompida, sem esta, ele não conseguirá obter condições de uma vida digna. E aqueles então, que já foram presos, quem irá dar uma chance a eles?

Não a punição aos 16 anos. Nossa pequena força pode tornar-se maior, quando nos unimos às pessoas. E é preciso querer encontrar o que está faltando na vida desses jovens, para depois julgar e não condená-los!

EE João Batista Ribeiro - 3ª Série do Ensino Médio
Aluna: Susana Alves Dias





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