Bauru e grande região - Sexta-feira, 04 de outubro de 2024
máx. 31° / min. 12°
16/09/01 00:00 -

Regras colocam o programa em risco

Regras colocam o programa em risco

Josefa Cunha
Impostas pelo Ministério da Saúde, as regras que regem o Programa de Agentes Comunitários são questionáveis do ponto de vista operacional, pois dificultam sua continuidade e confiabilidade

Como anunciado no último domingo, o JC nos Bairros retorna hoje ao assunto Programa de Agentes Comunitários de Saúde (Pacs), lançado pelo Ministério da Saúde em 1998 e efetivado há um ano e três quatro meses em Bauru. Na edição passada, o caderno mostrou o trabalho e os frutos colhidos pelos 22 agentes que atuam na cidade, especificamente no Parque Jaraguá e Jardim Godoy, bem como a diferença que eles passaram a fazer na vida das pessoas assistidas. Testemunhos revelaram que muito além de detectar problemas orgânicos, os agentes vêm desempenhando papel fundamental na descoberta de doenças de fundo emocional e de questões ambientais que influenciam diretamente na qualidade de vida da população.

No início visto como um instrumento a serviço eleitoreiro, o Pacs pode hoje ser tranqüilamente desvinculado de intenções escusas. Seu propósito, inegavelmente, é honroso, embora as regras que o circundem sejam questionáveis do ponto de vista da operacional. As exigências do Ministério da Saúde envolvendo a contratação dos agentes são inflexíveis ao ponto de inviabilizar a continuidade do programa. E os empecilhos não esbarram em questões de ordem financeira, já que Prefeitura e União parecem estar cumprindo corretamente os repasses para o custeio do programa. A Secretaria Municipal de Saúde, por sinal, até ampliou as previsões orçamentárias para 2002, no intuito de estendê-lo ao bairro Pousada da Esperança, que passaria a contar não só com os agentes comunitários, mas com uma equipe completa da Saúde da Família - médico generalista, enfermeiros, auxiliares e agentes.

O maior entrave - que já vem preocupando os coordenadores do Pacs - é renovar os contratos existentes. A primeira “leva” de agentes foi contratada pela Fundação Véritas, mas a organização não vê qualquer possibilidade de prorrogar o convênio, cujo prazo de vigência termina em maio do ano que vem. E o pior: a Secretaria Municipal de Saúde ainda não recebeu qualquer aceno de outra organização não governamental ou assistencial interessada em abraçar o programa.

Pelas regras do Ministério da Saúde, o convênio para viabilização do Pacs ou Programa de Saúde da Família tem de ser feito com apenas uma única entidade, mas estas - no caso, a Fundação Véritas - também enfrentam dificuldades legais de ampliar o número de funcionários contratados temporariamente.

A Fundação Véritas mantém 22 agentes e, dentro de poucos dias, deve contratar mais quatro agentes (eles vão atuar no Parque Jaraguá), atingindo o número máximo de funcionários que pode ter em caráter temporário. Isso, portanto, inviabilizaria de cara o projeto que a Secretaria Municipal de Saúde tem de ampliar o programa. A solução mais plausível aparentemente estaria no esforço conjunto de várias entidades amparando as contratações, mas as normas que regem o programa não permitem. Em síntese, a continuidade do Pacs, por enquanto, depende diretamente de uma ONG ou entidade disposta a assumir os contratos temporários.

Financeiramente, essa iniciativa está longe de ser atraente. É claro que os salários pagos aos agentes não saem dos bolsos da conveniada, mas é ela quem fica inteiramente responsável pela administração das contratações, regidas pelo sistema celetista. Indiretamente, portanto, quem contrata tem de arcar com a feitura das folhas de pagamento, rescisões, férias e outros procedimentos ligados ao setor de recursos humanos. É um gasto não reembolsado, vale registrar.

Em termos conceituais, entretanto, o prejuízo é muito maior para o programa e seus assistidos. Se a conseqüência básica do trabalho realizado pelos agentes nas visitas domiciliares é a confiabilidade estabelecida entre eles e a população, o que pensar de um rompimento súbito, decorrente das burocráticas regras impostas pelo governo? No mínimo, um contra-senso.

Antes que uma mera questão de prazo venha pôr por terra um trabalho tão humanitário, é preciso que os poderes públicos envolvidos encontrem uma alternativa. Um rompimento cairia como um balde de água fria na cabeça das pessoas que, inicialmente resistentes e desconfiadas, passaram a acolher e confiar nos agentes, quando não incorporá-los ao rol de amigos e parentes. Todos os agentes ouvidos pelo JC nos Bairros contaram que demoraram a ser aceitos pela população, que, compreensivelmente, custou a acreditar na boa vontade gratuita. Uma vez convencidos, no entanto, os assistidos passaram a quase depender dos agentes, acatando orientações e fazendo deles quase que seus gurus particulares. A reportagem confirmou que a palavra dos agentes soa como conselho incontestável.

Por tudo isso, não é justo que essa relação seja rompida ou mesmo alterada - no caso de haver substituição dos agentes - por questões exclusivamente burocráticas. Talvez uma falha desse tipo venha representar um retrocesso em termos de saúde preventiva, pois dificilmente as pessoas ora assistidas confiarão na seriedade do programa quando os ajustes necessários forem realizados. É preciso corrigir agora.

Conheça o perfil dos bairros

Em pouco mais de um ano de trabalho, os agentes comunitários de saúde conseguiram identificar as doenças que atingem as famílias cadastradas no programa e algumas particularidades do ambiente onde vivem que têm ligação direta com a qualidade de vida e, conseqüentemente, com a incidência de problemas de saúde.

A princípio, a Secretaria Municipal de Saúde esperava resultados muito diferentes entre os bairros assistidos - Parque Jaraguá e Jardim Godoy -, tendo em vista que as condições de seus moradores são bastantes distintas. Os números, porém, surpreenderam pela semelhança. Com exceção de uma ou outra peculiaridade, que identificou, por exemplo, um número grande de gestantes adolescentes no Jaraguá e uma quantidade enorme de idosos no Godoy, pouca diferença há entre os bairros, apesar de a infra-estrutura do Jaraguá ser muito deficitária em relação ao Jardim Godoy.

Nada de muito gritante foi detectado, mas alguns dados chamaram a atenção como o número de pessoas que pagam planos de saúde. Apesar de mais pobre, a população do Jaraguá supera o Godoy em números de beneficiados. Isso talvez se deva ao fato de o Godoy concentrar um número grande de idosos, faixa etária que costuma encontrar dificuldades para contratar o serviço de assistência médica particular. Confira os índices a seguir:

Parque Jaraguá

Total de famílias atendidas: 2.609
Número de pessoas: 10.563

Doenças por faixa etária

0 a 14 anos
Deficientes físicos 0,50%
Epiléticos 0,08%
Hipertensos 0,25%
Tuberculosos 0,03%

Acima de 15 anos
Alcoólatras 0,92%
Chagas 0,07%
Diabéticos 2,44%
Epiléticos 0,40%
Hipertensos 9,87%
Hansenianos 0,04%
Tuberculosos 0,09%

Gestantes

Com idades entre 10 e 19 anos 0,82%
Com 20 anos ou mais 1,15%


Escolaridade

Pessoas com idades entre 7 e 14 anos
freqüentando a escola 96,27%
Alfabetizados acima dos 15 anos 87,53%
Assistidos por plano de saúde 7,29%

Infra-estrutura

Tomam água da rede sem qualquer tratamento 66,39%
Filtram 31,01%
Fervem 2,41%
Usam a cloração 0,19%

Vivem em casa de tijolo/adobe 91,38%

Lixo produzido recolhido na coleta pública 96,51%
É enterrado 1,3%
São jogados a céu aberto 2,18%


Contam com sistema de esgoto 97,01%
Utiliza fossa 1,03%
Despeja a céu aberto 1,69%


Energia elétrica contempla 99% dos moradores




publicidade
As Mais Compartilhadas no Face
(SF) © Copyright 2024 Jornal da Cidade - Todos os direitos reservados - Atendimento (14) 3104-3104 - Bauru/SP