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CPMF acusa sonegação sobre R$ 292 bi

CPMF acusa sonegação sobre R$ 292 bi

Nélson Gonçalves
O deputado federal Aloizio Mercadante (PT) denuncia que 16 mil contas bancárias apontaram movimentação bilionária.

Aloizio Mercadante Oliva, brasileiro, economista, professor universitário, nascido em Santos (SP) em 13 de maio de 1954, graduado em Economia pela Universidade de São Paulo (USP), com mestrado e doutorado na área pela Unicamp, deputado federal do PT é o entrevistado da semana. Candidato a uma cadeira no Senado Federal em 2002, ele está se dedicando na elaboração da proposta de política econômica do PT. Em visita ao JC, Aloizio Mercadante afirmou a alarmante cifra da sonegação fiscal no País somente com o levantamento feito pela Receita Federal via CPMF. São 16 mil contas bancárias que apresentaram movimentação de R$ 292 bilhões, um terço do PIB do País, mas que não reverteram em impostos. Veja os principais pontos da entrevista:

Jornal da Cidade - Qual é o impacto da crise Argentina sobre o Brasil?
Aloizio Mercadante
- A Argentina, do ponto de vista econômico, é um paciente terminal que está tendo sua vida prolongada com o pacote anunciado nesta semana, mas é uma medida que não a tira do caos. É insustentável a situação Argentina. Quanto mais a crise for prolongada mais o Brasil será afetado e isso vai levar a uma moratória da dívida, uma desvalorização ou dolarização da economia, que seria a pior hipótese para a Argentina, o Mercosul e o Brasil. A crise na Argentina atinge tão duramente o Brasil porque nosso País continua muito vulnerável do ponto de vista externo. Houve uma deterioração da balança de pagamento no governo FHC. Quando o FHC assumiu a dívida externa dobrou e o déficit de transações correntes - que é o que o Brasil precisa de dinheiro externo para financiar seus pagamentos - era US$ 1,7 bilhão e hoje é de US$ 27 bilhões. A necessidade de tomar mais US$ 27 bilhões neste ano é que faz com que qualquer turbulência atinja o Brasil, porque o País não consegue fechar suas contas.

JC - Por isso que o Real está desvalorizando de forma tão brusca?
Mercadante -
Sim e é por isso que o Governo tenta aumentar a taxa de juros, para atrair o capital especulativo, porque você tem um buraco onde as contas não estão fechadas. Acho que a trajetória de aumentar os juros internos não vai resolver a crise cambial e vai agravar a situação das finanças públicas. A cada um por cento de juros que o governo aumenta na taxa básica, essa que foi para 19%, o governo perde R$ 5 bilhões do Orçamento em apenas um ano. É muita coisa. E isso compromete o investimento de energia, de políticas sociais e a retomada do crescimento. O Brasil tem a vulnerabilidade nas contas públicas e no câmbio, por isso a turbulência internacional nos atinge de forma tão forte.

JC - E o agravante de crise energética nesse cenário?
Mercadante
- Neste ano ainda temos esse agravante. A crise energética paralisou os investimentos internacional no Brasil. No ano passado, nós tivemos US$ 30 bilhões de investimentos externos para privatizações, novas empresas e compra de empresas. Neste ano não teremos mais que US$ 18 bilhões. Por isso o governo está tentando atrair o capital especulativo que cobra um preço caríssimo, de cassino financeiro, que o País não pode continuar pagando. O Brasil vai ter que atacar de frente a vulnerabilidade cambial, exportar mais, substituir importações, defender mais o mercado interno, gerar superávit comercial, romper essa dependência desse capital especulativo.

JC - No caso da Argentina, o senhor acha que a moratória é inevitável?
Mercadante -
A não ser que haja uma renegociação da dívida. Na segunda-feira passada a taxa de juros da Argentina no over night estava 320% em peso e 60% em dólar. Isso é inviável, não há economia que segure isso. Isso são sintomas do colapso do ponto de vista do financiamento. Acho que os agentes financeiros não vão reabrir o crédito para a Argentina mesmo que o pacote for aprovado a médio prazo. Você ter uma pequena melhora de duas três semanas não resolve. A paridade é artificial entre o Real e o dólar, nós vimos isso aqui no Brasil. isso destruiu nossa capacidade de exportação, aumento violentamente a importação. Então, a um preço muito alto foi mantido o Real de forma artificial.

JC - O aumento do risco em função da Argentina é imediato. Qual a situação hoje do risco?
Mercadante -
A Argentina passou de 600 pontos para 1.600 pontos. E o Brasil já passou de 1000 pontos. Há uma relação, lamentavelmente. Não é assim, mas os investidores associam o mercado com o Brasil e o Mercosul, como se fosse a mesma coisa. Toda crise lá tem repercussão aqui e aumenta o custo do financiamento. Alguns bancos não conseguiram rolar a dívida neste período. Colocaram títulos no mercado internacional e não conseguiram rolar a dívida. Os recursos estão se retirando e o País fica sem crédito. A crise da Tailândia, Rússia, Argentina nos atinge porque não podemos ter um déficit de US$ 27 bilhões. Tem que eliminar essa dependência.

JC - A Argentina está falando em ajuste fiscal, gastar só o que arrecada. Eles deveriam ter feito isso antes, isso é premissa para sair da crise?
Mercadante -
Veja o exemplo. O governo aumentou a taxa de juros de janeiro para cá em quase 4%. isso significa R$ 20 bilhões a menos no Orçamento em apenas um ano. Como o País tem que pagar suas contas, fica fácil entender que o governo vai fazer mais cortes em investimentos e aumentar impostos. Veja o preço que pagamos para manter o Real no câmbio. Mesmo que não fique por um ano, o governo inevitavelmente vai cortar despesas e aumentar impostos de novo. Repito. Enquanto não sairmos dessa ciranda vamos continuar pagando cada vez mais impostos sem ver resultados. Assim não tem energia, porque não tem dinheiro para investir na área, porque tem que usar o dinheiro para pagar juros. Nós estamos em um quadro de recessão com a crise energética e o problema na Argentina agora. Aumentar os juros é parar investimentos, que aprofunda a recessão. É uma lógica da qual somos prisioneiros e precisamos romper.

JC - Aumentar os juros é equívoco?
Mercadante -
Foi um grave equívoco. O Brasil insiste nesta trajetória e isso não vai reverter a crise cambial. Não haverá crédito se a Argentina não se estabilizar. E um por cento a mais nos juros não vi dar resultado, vai agravar a situação interna. Tínhamos que ter um programa de exportações e substituir importações. O Brasil tem que mudar o modelo, atacando a crise cambial na raiz. Como um país que é a 10ª economia do mundo, que tem uma indústria diversificada, que tem potencial agrícola fantástico, pode viver com 43 milhões de pessoas ganhando menos de R$ 2,00 por dia, pode viver com 10 milhões de pessoas desempregadas? O brasileiro quer trabalhar, não quer esmola, quer o direito a trabalhar. O emprego não pode ser tratado como subproduto. A saída tem custo, não é rápida, não é fácil, mas é possível. E quanto mais dedo sairmos dessa ciranda, mais cedo vamos tornar milhões de brasileiros cidadãos.

JC - Mudando o rumo, e o combate a sonegação, tem que potencial de arrecadação no Brasil?
Mercadante -
Vou dar um dado que quero ver publicado no jornal: A Receita Federal mobilizou, autorizado pelo Congresso, com dados da CPMF, 16 mil contas bancárias que movimentaram R$ 292 bilhões e declararam Imposto de Renda isento ou não declararam. Veja 1/3 do PIB brasileiro passou por 16 mil contas bancárias que não pagaram imposto. Isso é caixa dois de grandes empresas, lavagem de dinheiro, narcotráfico, contrabando, jogo do bicho. Estes tem que pagar o que devem em impostos. Se isso acontecer, quem paga paga menos. Você pode reduzir a carga tributária com a economia organizada. Nós somos o quarto país mais desigual do planeta. A política tributária tem que ser um instrumento de igualdade social. Os ricos não pagam impostos. Na CPI dos Bancos eu citei que 49% dos bancos pagaram 0% de Imposto de Renda e o Everaldo Maciel confirmou. Isso é um absurdo.




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