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"Biofeedback" vira arma contra vícios

"Biofeedback" vira arma contra vícios

Daniela Bochembuzo
Aliando condicionamento mental e informática, terapia permite que paciente controle suas ondas cerebrais e saia do vício

Um instrumento criado há 40 anos nos Estados Unidos está revolucionamento o tratamento de dependência química: é o biofeedback, termo em inglês para “sistema de retroalimentação da vida”. A terapia alia condicionamento mental a softwares específicos para medir respostas do corpo, que, visualizadas, permitem ao paciente controlar suas ondas cerebrais.

Com o autocontrole das ondas cerebrais, o paciente pode, inclusive, comandar a sua produção de endorfina, substância química que age no cérebro criando sensação de conforto e bem-estar. Dessa maneira, ele alivia dores e outros tipos de tensões e sensações que o incomodam.

“Por meio do biofeedback, o paciente de dependência química vai se auto-regular para que os neurotransmissores tenham uma ligação e produzam uma onda de prazer que era aquela mesma gerada pela droga”, explica a psicóloga Elizabeth Freitas Girola, que há um ano utiliza o biofeedback entre seus pacientes de consultório.

De acordo com Elizabeth, as aplicações da terapia norte-americana são amplas. Além da dependência química, o tratamento pode se estender a casos de estresse, doenças psicossomáticas, síndrome do pânico, dores musculares, enxaqueca, paraplegia e até Lesões por Esforço Repetitivo (LER).

A base do tratamento é a mesma. Conectado a aparelho de alta precisão, o paciente emite impulsos a um software instalado em computador. O equipamento, por sua vez, permite que o paciente visualize e ouça os sinais emitidos pelo corpo, como temperatura, respiração, fluxo sangüíneo, batimentos cardíacos, pele e ondas cerebrais.

Convertidos em gráficos, os dados vão sendo trabalhados em programas que estimulam a resposta do paciente por meio da participação em jogos e exercícios. Ao psicólogo, cabe a tarefa de estipular metas. Na tentativa de alcançar esses objetivos é que a pessoa realiza o seu condicionamento mental.

Elizabeth explica que, no caso do dependente químico, o objetivo do biofeedback é ajudá-lo a aumentar seu ritmo cerebral, que é baixo. “Com o ritmo do cérebro mudando, queremos que ele encontre prazer na vida novamente. Ele não precisa mais das drogas para mexer com as emoções”, afirma.

O principal benefício do biofeedback, acredita a psicóloga de Bauru, é que o paciente faz o tratamento de maneira consciente. “É um tratamento que não usa nenhum tipo de droga, não é invasivo nem de conscientização. É de auto-regulação, cujo comando é ‘deixe acontecer’. É o paciente com ele e o ganho é todo dele”, comenta Elizabeth.

Dependente químico desde os 15 anos, o representante comercial Marcelo Pacheco Azevedo, 26 anos, recorreu ao biofeedback em agosto do ano passado, após inúmeras e diversas tentativas de tratamento para sua doença. “Um amigo me indicou e resolvi tentar porque era algo que não exigia internamento e dependia apenas de mim”, conta.

Azevedo iniciou o tratamento sem estar em abstinência. A partir de dezembro, percebeu os primeiros resultados. “Comecei a usar drogas e não me sentir bem, não sentia mais prazer com aquilo. Hoje, não consigo nem fumar ou beber café. Não uso mais nenhum estimulante, procuro direcionar todos os esforços para meus projetos de vida, que são meu trabalho e minha família”, garante.

O represente comercial ainda não terminou o tratamento de biofeedback, realizado semanalmente. “Depois que ele atingir seu objetivo, não precisará mais voltar porque o biofeedback consiste em mudança de atitude e isso é que dá a certeza da recuperação absoluta”, conclui Elizabeth.

Serviço

Crer - Clínica de Psicofisiologia Aplicada e Biofeedback. Rua Gustavo Maciel, 15-07, 3.º andar, sala 36. Telefone: (014) 223-6089.

Como funciona

Os treinamentos em biofeedback são feitos por meio de sensores conectados ao corpo do paciente. Altamente sensíveis, os equipamentos monitoram processos ou respostas fisiológicas específicas do corpo, que são amplificadas e transformadas em sinais (visuais ou auditivos).

Os dados são utilizados pelo paciente como guia, enquanto ele pratica uma série de exercícios. A meta é aprender a mudar funções fisiológicas, determinadas pelo profissional que acompanha o caso.

O paciente pode se guiar por sinais elétricos emitidos pela pele, assim como por sua temperatura. Outros dados podem incluir os batimentos cardíacos, a respiração e o fluxo sanguíneo. Cada um deles ajuda o profissional a avaliar um tipo de estado emocional e a profundidade de relaxamento.

Depoimento de um paciente

“Comecei a usar drogas aos 15 anos. Comecei com cocaína e tinha um histórico de dependência de drogas lícitas na família. No começo, não tinha consciência de que era uma doença.

“Até uns 20 anos de idade usei drogas controladamente, ainda tinha mais responsabilidade com trabalho e um monte de coisas. Mas depois dessa idade, atropelei tudo e passei a não ligar mais para nada. Realmente, a importância na minha vida era usar drogas, esse era meu prazer. As outras coisas eram meios e maneiras para conseguir drogas.

“As internações começaram aos 20 anos. Meus pais passaram a investir em internações em clínicas, hospitais psiquiátricos, mas o que conseguia era ficar alguns meses parado porque me enchiam de remédios. Só dois lugares não foram assim: grupo religioso e grupo de apoio.

“Através das internações fui aprendendo a respeito de dependência química, tudo que a droga fazia e coisa e tal. Apesar disso, toda a conscientização não me tirava a vontade de usar. Sabia que estava me destruindo, fazendo um monte de coisas, mas tinha vontade de usar. Fazia bem, ou melhor, me sentia bem com as drogas, mesmo com todas as conseqüências: perder família, emprego, monte de coisas.

“Até que pedi ajuda a um amigo que estava fazendo treinamento com biofeedback. Ele falou que era muito bom, que deveria conhecer. Acabei vindo e gostei, porque era totalmente diferente de tudo que tinha visto. Não iria precisar ficar internado, tomar remédios e mais nada. Logo de início, me marcou o que a psicóloga disse: ‘vai depender apenas de você’. E aquilo realmente me interessou, indicando que poderia trabalhar e conseguir o êxito que estou tendo atualmente.

“Iniciei o treinamento em agosto do ano passado. Era mais uma tentativa, uma saída para um problema que me incomodava, que era tirar essa obsessão por usar drogas. Consciência eu tinha que fazia mal, que estava me destruindo e fazendo perder tudo, aliás, meus pais tinham me mandado embora de casa, já tinha perdido dois casamentos.

“Na época, morava em uma pensão em Jaú e vinha uma vez por semana fazer o treinamento em Bauru. Com o tempo, fui perdendo aquele tesão pelas drogas, foi me fazendo mal.

“De janeiro para cá, ainda tentei continuar a usar. Minhas companhias eram sempre de usuários, então, estava lá, usava qualquer tipo de droga, todo mundo ficava legal e eu não me sentia bem. Não era mais minha praia, não precisava mais daquilo. Ficava legal normal, sem precisar usar.

“Conversando com a psicóloga, ela explicou que esses efeitos eram resultado do treinamento de biofeedback. Aí, comecei a investir ainda mais no tratamento e ver resultado, que era tirar o prazer de usar drogas. Daí para frente, parece que foi ainda mais rápido.

“Sempre achei os exercícios legais porque via minhas ondas cerebrais e tentava controlá-las. Depois, comparando os gráficos, via progresso e isso me animava, como me anima até hoje. Já estou terminando os pontos cerebrais e percebi que consegui muita coisa em relação à dependência química e a minha maneira de ser. Era mais agressivo, hoje sou mais equilibrado para tratar as pessoas e resolver minhas coisas sem agredir meu físico ou verbalmente.

“O tratamento é bem interessante. Mexe com a cabeça e você não sente vontade em usar drogas, aliás, sinto até nojo em falar disso. É algo que não me interessa mais e olha que há tempos atrás era fã número um. Parei com tudo: não fumo, não bebo nem café. Não uso mais drogas lícitas ou ilícitas. Agora, invisto nos meus projetos próprios.”

Marcelo Pacheco Azevedo, 26 anos, representante comercial.




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