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21/04/01 00:00 -

Carlos Moreno é Dom Quixote

Carlos Moreno é Dom Quixote

Gustavo Cândido
O eterno garoto-propaganda da Bombril Carlos Moreno, apresenta hoje às 21 horas e amanhã, às 20 horas no Teatro Municipal, a peça “Quixote”, de sua autoria em parceria com Fábio Namatame, que também dirige o espetáculo. Trata-se de uma adaptação livre do clássico romance espanhol “O Engenhoso Fidalgo Dom Quixote de La Mancha”, de Miguel de Cervantes Saavedra sobre as aventuras do fidalgo Alonso Quijuana que, obcecado pela leitura de livros de cavalaria, acaba por perder a razão, transformando-se no cavaleiro andante Dom Quixote de La Mancha, que se vai pelo mundo para realizar seus sonhos.

A peça, que estreou em São Paulo, em setembro do ano passado e já foi apresentada em várias cidades do Interior paulista, não retrata o personagem central da maneira romântica e quase trágica com a qual se está acostumado. “Trouxemos do livro uma característica importante que é a paródia”, afirma Moreno. Por isso o seu “Quixote” é antes de tudo engraçado em sua desgraça, numa composição que mistura tragédia e riso.

O ator, que se divide em vários personagens no espetáculo “solo”, na realidade buscou em “Quixote” um paralelo com a vida do ator, que durante uma representação, reveste-se de uma máscara/personagem por meio da qual ele atua. Em visita ao JC, antes do espetáculo, ele falou sobre a criação do seu “Quixote” e de como ele expõe suas próprias reflexões.

Jornal da Cidade - Como surgiu a idéia de adaptar “O Engenhoso Fidalgo Dom Quixote de La Mancha” para o teatro?
Carlos Moreno -
Eu queria trabalhar algumas coisas diferentes como ator, tinha algumas coisas para experimentar, me desafiar. Estava procurando um texto pronto ou um personagem em quem pudesse me inspirar quando lembrei de Dom Quixote. Li o livro e adorei, fiquei maravilhado. Ele serviu bem porque queria levar algumas reflexões minhas para o palco, reflexões como ator, cidadão... que eu queria ver no palco. Acho que o teatro é para isso, para refletir, aliás qualquer arte é assim. O “Dom Quixote” mostra como nossas atitudes são transformadoras, cada uma a sua maneira. O artista, no fundo, tem que estar no palco, fazendo aquilo que ele acredita. As pessoas têm que fazer aquilo que elas acreditam, “Dom Quixote” é muito bonito porque ele mostra para gente que se deve ir atrás dos sonhos.

JC - O fato de ser um clássico da literatura mundial atrapalhou em algo nessa adaptação?
Moreno -
Nossa preocupação não foi de contar toda a história do livro e todos os episódios. Nossa intenção era usar os elementos e personagens que interessavam para a gente para fazer uma leitura muito particular que traça um paralelo do Dom Quixote com o trabalho do ator e o mundo teatral. Dom Quixote nos faz lembrar o tempo todo o quanto é importante batalhar pelo o que se acredita, pelo seu sonho.

JC - Quando vocês escreveram o texto?
Moreno -
A peça é recente, tivemos sete meses de preparo. A gente começou a trabalhar diariamente em fevereiro de 2000, até a estréia em setembro. Nós não tínhamos um texto pronto, tínhamos um roteiro básico e eu, ao mesmo tempo, já tinha estudado bastante o livro e escolhido uns episódios que queria usar. Fizemos o processo inverso, ficamos com o texto pronto praticamente junto com a estréia, aí montamos um esqueleto do espetáculo e vimos o que estava repetido ou faltando, fizemos um acabamento e o espetáculo ficou “redondo”.

JC - Você está sozinho no palco?
Moreno -
Sim, eu digo que é um espetáculo solo, porque a idéia de monólogo parece uma coisa chata, aquela pessoa lá sozinha falando, falando... É um solo porque eu estou sozinho em cena, mas na verdade faço vários personagens: o Dom Quixote, o Sancho Pança, o narrador, que é uma referência ao próprio Cervantes e em algumas cenas eu faço vários personagens que interagem, então na verdade existem “diálogos”. Tem outra coisa que é o meu diálogo com a platéia. Eu começo o espetáculo conversando com eles e sem que eles percebam a peça já começou.

JC - Quanto tempo dura a peça?
Moreno -
Uma hora e um pouquinho porque depende dessa parte, em que eu converso com a platéia, depende de quanto tempo esse papo rende.

JC - O público vai rir muito?
Moreno -
É um espetáculo muito engraçado. A imagem do Dom Quixote que as pessoas estão acostumadas é a do sonhador, do idealista, aquela coisa mais poética, romântica e a gente trouxe na nossa adaptação uma característica original do livro que é a paródia. O livro na realidade é uma paródia aos livros de cavalaria da época dele. É uma peça muito divertida, na qual nós trouxemos o lado engraçado do livro.

Serviço

O espetáculo “Quixote”, com Carlos Moreno, dirigido por Fábio Namatame, uma adaptação livre da obra de Miguel de Cervantes, será apresentado hoje, às 21 horas e amanhã, às 20 horas, no Teatro Municipal. Os ingressos podem ser adquiridos no local por R$ 15,00.

O cavaleiro da triste figura

“Num lugar da Mancha, de cujo nome não me quero lembrar, vivia, não há muito tempo, um desses fidalgos que usam lança em hastilheira, adarga antiga, cavalo magro e galgo corredor...” É assim que começa “O Engenhoso Fidalgo Dom Quixote de La Mancha”, de Cervantes, um dos maiores clássicos da literatura mundial em todos os tempos.

Escrita em duas partes, uma em 1605 e outra em 1615, um ano antes do autor falecer. A obra conta como, na Idade Média, o fidalgo Alonso Quijuana, após ler muitos livros de cavalaria andante, enlouquece e sente a necessidade de imitar os cavaleiros fictícios. Para isso veste uma armadura velha, que pertenceu aos seus ancestrais, convida o seu vizinho Sancho Pança, em troca de um governo de uma ilha, para ser o seu fiel escudeiro. Montado em seu rocim fraco, transforma-se no Dom Quixote e parte em busca de aventuras, salvando e protegendo fracos e oprimidos, donzelas em perigo e tantos outros injustiçados.

“Dom Quixote” só teve uma segunda parte porque surgiu uma edição falsa com o pseudônimo Avellaneda. Isso perturbou Cervantes, que publicou a sua verdadeira continuação fazendo questão de deixar o seu herói morto para que ninguém pudesse continuar a sua história.

A obra-prima de Cervantes influenciou autores em todo mundo. Para citar alguns, basta lembrar “Madame Bovary”, de Gustave Flaubert, considerada uma “Dom Quixote de saias”. Na Rússia, Dostoievski preserva uma natureza quixotesca no seu “O Idiota” (influência que o próprio Dostoievski confessa numa correspondência). A obra-prima do inglês Charles Dickens, “As aventuras do Sr. Pickwick”, também tem traços de “Dom Quixote”.

No Brasil, José de Alencar, Aloísio de Azevedo, Coelho Neto e Machado de Assis bebem na obra cervantina, Mais recentemente, no pré-modernismo, Lima Barreto lembra “Quixote” com “Triste Fim de Policarpo Quaresma” e na segunda fase do modernismo, José Lins do Rego reencarna o cavaleiro da triste figura no personagem Capitão Vitorino, em “Fogo Morto”.




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