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18/11/18 07:00 - Opini�o

Novo governo lan�a o "Menos M�dicos"

Zarcillo Barbosa

O recém-empossado presidente de Cuba, Miguel Diáz-Canel, mostrou que também sabe dançar conforme o ritmo, seja mambo, ou samba. Mandou recolher os 8 mil e tantos médicos do programa Mais Médicos, iniciado há cinco anos pelo PT. A sete semanas da posse, Jair Bolsonaro contratou a primeira crise do novo governo. A saída dos cubanos pode deixar 24 milhões de brasileiros sem assistência básica de saúde, principalmente nos grotões do país e nas periferias pobres das metrópoles. Nesses lugares, os doutores brasileiros não querem trabalhar. Em um terço dos municípios atendidos, os profissionais da Ilha foram os únicos a aceitar as vagas. Hoje são ampla maioria em aldeias indígenas e regiões ribeirinhas. Mas, promessa de campanha, promessa cumprida. Fora os "vermelhos". A Organização Pan-Americana de Saúde calcula que vão morrer, pelo menos uns 250, até que se recomponha parte da rede. Talvez se afirme que morreriam, da mesma forma.

Além do Brasil, outros 66 países mantêm contratos de cooperação médica com Cuba. O dado mostra que a importação de doutores não é invenção do PT, como costuma sugerir o presidente eleito. Havana lucra algo em torno de 7,8 bilhões de dólares anuais com a exportação de trabalhadores da saúde. A OMS reconhece que "Cuba tem algo a ensinar ao mundo nessa resposta rápida" às emergências humanitárias. Na África, eles foram os únicos que tiveram o desprendimento de enfrentar o vírus Ebola. Aquele que mata por contágio, em uma semana.

A promessa de Bolsonaro, de "dar uma canetada mandando 14 mil médicos lá para Cuba", pode ter rendido votos nas eleições. A lamentar é que, por trás do discurso agressivo está oculto o problema imediato: o novo governo parece não ter ideia de como substituir os cubanos que já estão deixando o país. Dos 5.570 municípios do Brasil, 3.243 só têm médicos cubanos. Graças a eles, durante os cinco anos do programa, 63 milhões de carentes receberam atendimento médico pela primeira vez na vida. Aqui em Bauru, a Prefeitura já contabiliza o estrago. Os dez médicos de Cuba deixarão de realizar 3.840 consultas por mês. São 2.800 horas médicas semanais a menos.

As culturas ocidentais não aprovam o tráfico humano definido como "atividade criminal organizada, na qual seres humanos são tratados como posses a serem controladas e exploradas" (Webster). Bolsonaro tem certa razão quando comparou os profissionais a "escravos". O governo brasileiro paga cerca de R$11 mil, per capita, mas o médico recebe apenas R$2.400. Não fosse as moradias que as prefeituras fornecem - algumas também auxílio-alimentação - seria difícil sobreviver. A fatia do leão é creditada na conta bancária da ditadura. A promessa é de que terão algo mais, quando voltarem à Ilha. A família permanece lá, assistida, com trabalho e vagas nas universidades para os filhos. A desculpa do regime prende-se aos custos do Estado para formar o profissional. Eles têm ajuda financeira para se dedicarem integralmente aos estudos. O capital investido precisa retornar, para que outros tenham a mesma oportunidade. Ninguém sai de Cuba para trabalhar no exterior, com uma arma apontada à cabeça. Mas, é sabido, quem não colabora sofre consequências, extensivas à família, que vão perder certas facilidades de acesso. Também fica claro que a situação dos cubanos, no Brasil, viola as nossas leis trabalhistas. Os cubanos deveriam ser pagos diretamente.

Quando tiveram chance, muitos desses indivíduos traficados fugiram. Apenas nos últimos dois anos, 3.100 cubanos obtiveram permissão de entrada nos Estados Unidos, na condição de asilados. Lá, eles vão trabalhar, no máximo, como auxiliares de enfermagem. Como punição, o regime proíbe suas famílias de deixarem Cuba para visitá-los. Também é verdade que, enquanto exporta profissionais para ganhar dinheiro, na Ilha persistem explosões de epidemia de cólera e dengue.

De tudo o que já foi dito e escrito, resta claro que o programa lançado por Dilma, em 2013, tem suas artificialidades e não poderia mesmo ser eterno. Se exigirem de bolsistas do Fies, ou de formados em universidades públicas, cumprirem períodos de serviços nos cafundós, o "trabalho escravo" se caracterizará, da mesma forma. Resta uma questão essencial, ainda não respondida: Por que um país tão maior que Cuba, como o Brasil, não consegue formar médicos suficientes à Atenção Básica na saúde? Bolsonaro, pelo jeito, ainda não desceu do palanque das redes sociais. Acaba de lançar o Menos Médicos.

 





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