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18/08/18 07:00 - Opini�o

Maio de 1968... Chegou 2018

Paulo Neves

Em maio de 1968 eu tinha 20 anos. Tinha escutado muita bossa nova, movimento mundial que deu voz aos "sem voz" (João Gilberto não me deixa mentir...); tinha ouvido muito bolero e dançado "Relógio" ao som da orquestra Nélson, de Tupã, ou seria Capelozza, de Jaú, ou ainda Laércio, de Franca, não sei quantas vezes... E o tempo não passava! Participava de brincadeiras dançantes onde cada convidado levava um refrigerante; beijinhos de soslaios (isso era muito bom!!!); ficava na Rua Batista de Carvalho, olhando as garotas que saíam da sessão das 20 horas, no Cine São Paulo, elas subiam pela esquerda e desciam pela direita da rua, era delicioso! Bons tempos, hein?

Olhares eram trocados... Até a próxima semana, na sessão das 20 horas, no mesmo cinema e rendia... O tempo não passava! Gostava e ainda gosto de futebol, guardava os meus times de botão em caixas de sapato e narrava como Edson Leite os jogos com celuloides; esperava com ansiedade a Copa do Mundo, no México. Ás vezes fico pensando: será que tudo aconteceu em 1968? Claro que não! Mas 1968 foi um ano-constelação na qual acredito, coincidem fatos, movimentos e personagens inesperados. Eu lia Sartre (comprado na Tipografia Brasil), Marx, Gabriel Garcia Marques, Engels, a cabeça ficava um trevo, mas queria saber tudo, a bem da verdade não entendia muito, mas queria saber, ler, discutir e brigar.

Escrevi minha primeira peça em junho de 1968, o Jornal da Cidade publicou matéria a respeito da mesma que estreava no Automóvel Clube, achei o máximo! Pena que não foi em maio... Seria a consagração!

Até a primeira visita na casa da dona Eni, foi em maio de 1968, sentia-me absoluto com 20 anos. Estava fazendo a minha revolução particular... Sexual é verdade, mas a minha revolução!

Hoje estou nostálgico e depressivo (será que eu deixei?), afinal existem momentos e momentos... Lembro-me que torcia para Fidel Castro, porque ele desafiava os EUA; os ensinamentos de Che, de como fazer uma revolução, estavam ali na Rua Gerson França 6-66 (hoje Casa de Cultura Celina Neves); torcia pelos estudantes nas ruas do Quartier Latin, em Paris; assisti três vezes "A Chinesa", de Jean Luc Godard; torcia pelo Dom Quixote que desafiava os moinhos e torcia também para que a primeira namorada universitária (eram fases!) fosse para cama comigo sem conflitos e dramas de consciência (como se fosse fácil não a ação, mas a contração)... O tesão havia chegado! (versão 1968).

Achava bonita a palavra utopia, esperança de mundo melhor; vibrava com Vandré "caminhando" e acreditava (ou acredito?) que a história não é simplesmente uma coleção de fatos, mas um horizonte de possibilidades.

Chegamos vivos em 2018 e a história não se repetiu... Que coisa! Tenho analisado muito esses 50 anos e procuro descobrir o que não conseguimos conquistar... Li em algum lugar que maio de 1968 retorna de forma recorrente porque ainda não foi completamente digerido, e será necessário esperar pela geração seguinte para que tenha um olhar diferente sobre o episódio. Bem, isso já é tarefa para Talita, Thiago e Aline e a geração que está aí... é a continuação da espécie utópica.

O autor é diretor de teatro e professor de história do Brasil, desempregado e procurando emprego.





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