Bauru e grande região - Sexta-feira, 19 de abril de 2024
máx. 31° / min. 12°
24/09/17 07:00 - Opini�o

O amargo regresso

Zarcillo Barbosa

Neste País existem temas recorrentes, como se a sociedade quisesse voltar, em vez de avançar em um mudo cada vez mais voltado para o utilitarismo tecnológico. Tivemos, há pouco, manifestações autoritárias à exposição de obras de arte em Porto Alegre, por contrariarem o reacionarismo estético de alguns. Vivemos a polêmica sobre se os psicólogos podem ou não curar a homossexualidade, como se esta fosse uma doença. No início do século passado, Freud fulminou a questão da injustiça e crueldade de se perseguir homossexuais como se fossem criminosos. Além de não ser crime, tampouco é doença que possa ser curada física ou mentalmente. A felicidade é um problema individual. Cada um deve procurar, por si, tornar-se feliz. O difícil é ser feito de carne e ter que viver como se fosse de ferro - advertia o pai da psicanálise. A OMS já se pronunciou oficialmente nesse eito em 1994. E aqui continuamos nessa discussão. Em meio a essas querelas bizantinas, apresenta-se o general Antônio Hamilton Mourão para defender um golpe militar no Brasil. Providência capaz de dar um jeito na crise moral-político-judiciária, numa porrada só. Faz lembrar um outro Mourão, também general, integralista, que mandou a Divisão de Infantaria de Juiz de Fora ocupar a cidade do Rio de Janeiro, em 1964. O plano de deflagrar uma tomada de poder pelo "elemento surpresa" deu certo. Mas o País, depois de 22 anos, foi devolvido aos civis sob inflação e tutela do FMI. E ainda se insiste no passado. Como diz o Xico Sá, só falta pedirem a volta da Malt 90 e da Seleção do Lazaroni.

Nem precisa pesquisa. Mais da metade dos brasileiros concorda com a possibilidade de se estabelecer uma "intervenção militar". Os poderes estão cheios de corruptos. O próprio presidente da República foi criminalmente denunciado duas vezes. Acontece que não são os militares, os políticos ou o Judiciário que vão acabar com a corrupção e a impunidade. Nenhum governo é solução para o País; o governo e suas instituições são partes de um mesmo problema (Ronald Regan). Se alguma revolução tiver que ser feita, terá que partir do povo. Pelo voto. Sem salvacionismo. O "sebastianismo" é medieval. Esperar pela volta do rei para pôr ordem na casa. "Para todo problema complexo existe sempre uma solução simples, elegante e completamente errada" - até os ativistas políticos, como Henry Mencken, sabem disso.

O general da ativa Antônio Mourão, convidado a uma sessão da Maçonaria, em Brasília, compareceu fardado, com todas as suas condecorações no peito. Foi direto ao ponto: "Na minha visão, que coincide com as dos companheiros que estão no alto comando do Exército, estamos numa situação em que poderíamos lembrar da tábua de logaritmos, de aproximações sucessivas. Até chegar ao momento em que ou as instituições solucionam o problema político, pela ação do Judiciário, retirando da vida pública esses elementos envolvidos em todos os ilícitos, ou, então, nós teremos que impor isso". O militar, já havia sido exonerado do Comando Sul, em outubro de 2015, por criticar a gestão Dilma Rousseff e reclamar dos seguidos escândalos de corrupção. Desta vez, nenhuma reprimenda. O ministro da Defesa, Raul Jungmann, limitou-se a um pedido de explicações ao comandante do Exército, Eduardo Villas Bôas. O presidente da República, "comandante em chefe das Forças Armadas", faz de conta que não sabe de nada. O comandante disse que foi tudo resolvido no âmbito doméstico. Em março do ano que vem, o general Mourão passa para a reserva. A estratégia é não criar um "mártir". Durante as manifestações, em Brasília, pelo impeachment de Dilma, apareceu um gigantesco boneco inflável do general, vestido com uniforme militar, batendo continência e com a faixa presidencial no peito. Há sondagens para que se candidate à Presidência. E não é para o Clube Militar.

Em 1889, a justificativa da intervenção militar foi a proclamação da República. Em 1945, a desconfiança em relação ao governo de Getúlio Vargas. Em 1964, foi a "ameaça comunista". Ao que se supõe, o general Mourão quer uma intervenção militar para retirar da vida pública os "maus elementos". Parte ponderável da sociedade aplaude. Vivemos num período em que a classe política - esquerda, direita e centro - está de costas para a sociedade que sofre com o desemprego e a falência dos serviços públicos. O grande dilema: quem é que vamos pôr no lugar.

O autor é jornalista e articulista do JC





publicidade
As Mais Compartilhadas no Face
(SF) © Copyright 2024 Jornal da Cidade - Todos os direitos reservados - Atendimento (14) 3104-3104 - Bauru/SP